segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Vida e morte de Élton, o vidente – parte 2/5



Prever o futuro é um dom que muitos queriam ter. Aliás, acredito, é como todos os outros dons. Muitos invejam, os que têm fazem pouco caso e os empreendedores exploram ao máximo tal talento para ganhar dinheiro.

Dinheiro, aliás, é o objetivo de 99% das pessoas que me procuram – junto com o amor. Acredito que as duas coisas estão ligadas, mas não vou entrar na discussão agora. As coisas do coração não devem ser julgadas ou questionadas. Mas por outro lado, há uma grande dose de razão no amor, o que não deixa de ser irônico.

Uma vez um cliente pediu os números da loteria. Cristiano era o nome dele. Vou ser honesto – vejo estes números o tempo todo. Porém, não acredito que uma quantidade exorbitante de dinheiro trará felicidade. Se não trabalhasse, não conheceria pessoas maravilhosas, e talvez não teria a fama que gosto tanto. Sobre o cliente? Bom, respondi apenas quatro dos seis números, e os outros dois inverti. Ele ganhou uns dois mil reais na quadra.

Achei que isso me livraria do pobre coitado. Mas pura ilusão: a ganância o fez me procurar de novo. Novamente, indiquei 4 dos 6 números que saíram, e ele ganhou a quadra. A cena se repetia mais ou menos a cada 15 dias, e a dona do estabelecimento em que eu atendia o recebia com café, bolachas e todas as mordomias de um cliente VIP.

Até que um dia cansei. Recusei-me a atendê-lo. Mesmo com a insistência, promessa de maiores comissões pela consulta, não recuei. Como já disse, não preciso de dinheiro para ser feliz – e se precisasse, iria eu mesmo até a casa lotérica fazer a aposta certeira. Cristiano pediu para conversar, apenas.

- Olha, Élton, eu preciso de dinheiro para quitar uma dívida.
- Sinto muito, não posso ajudá-lo. Procure um emprego.
- Eu já trabalho em dois! Por favor, me ajuda, só esta vez. Depois, nunca mais procuro você.

A parte solidária do meu ser queria muito passar logo os seis números, para o cara ser feliz. Mas fui racional e recusei.

- Cuidado por onde anda, garoto! Coisas podem acontecer com você! – e saiu, batendo a porta.

Além desta ameaça, levei uma bronca daquelas da minha patroa. Mas ela não exagerou: sabe que sou o que mais traz clientes à casa – afinal, sou um cliente de verdade. Com certeza, não esquecerei tão cedo do tal Cristiano.

Nenhum comentário:

Postar um comentário