segunda-feira, 22 de março de 2010

O Encontro

Separados por um amontoado de concreto e uma lâmina de vidro, um lado era quente e úmido, com cheiros agradáveis e névoas de vapor que tornavam a visão menos clara. Já o outro estava frio, com ventos e folhas voadoras, além de um aspecto cinzento que remetia a um dia propício para o ócio e a reflexão. Minutos se passaram e Romão se enrolou na toalha, para tirar a água de sua pele, agora cheirosa e macia. O cabelo, mesmo curto, recebeu gel. A barba foi literalmente laminada, e o creme pós-procedimento dava um perfume especial à face. Olhou o relógio e ficou satisfeito em não ter se atrasado; a dama não poderia esperar um segundo sequer.

A chuva havia parado no instante em que se dirigia ao restaurante. Nada de movimento, barulho ou confusão. A casa ficava em um bairro próximo à zona rural, longe do movimento jovem característico do sábado. O horário também contribuía para isso, não eram oito da noite ainda. Somente aqueles que saíam do trabalho, ou tinham jantares românticos, ocupavam as mesas. Esmeralda era uma dessas pessoas e, mal havia chegado, Romão apareceu na porta do estabelecimento. O minuto que demorou para sentar-se foi regido pelo pianista local. A luz aconchegante incitava uma taça de vinho e uma boa conversa sobre a paz daquele momento.

- Estás deslumbrante – foram as primeiras palavras de Romão. A timidez da companheira de mesa era inegável. Haviam conversado algumas vezes pelo telefone, conheciam as vozes um do outro. Os olhos não traziam surpresas quanto à beleza alheia, pois já haviam visto fotos. Mas o primeiro contato físico, mesmo distante, é sempre precedido por um momento de hesitação, um frio na espinha (necessário).

Esmeralda havia recebido ajuda das pessoas jovens com quem convive quase diariamente. Foram elas que escolheram as roupas, a maquiagem, o perfume, a bolsa e os (poucos) acessórios. Não que ela não pudesse decidir por si mesma. Mas confia tanto no bom gosto de seus entes que entrega sua aparência, ainda impondo seus próprios limites. Seu sorriso disfarçava a ansiedade do momento, mostrando que sabia contornar situações daquele tipo. Apenas o tempo frio e chuvoso mudaram os planos, tudo levava a crer que o calor e o céu limpo ditariam o rumo da conversa.

Cada um contou um pouco sobre sua família. O que fazem para sobreviver, como passam o tempo livre. Já sabiam, mas riram sempre que encontraram algo em comum, desde a marca de chocolate preferida até a aversão à televisão aos domingos. A luz das velas dava um tom especial aos olhares que trocavam, o cheiro das massas locais despertou o apetite (lasanha e canelone seriam os pratos da noite).

Romão fez questão de lembrar do dia que se conheceram, pela tela de um computador. Recordava o que havia feito desde o momento de acordar, até a hora de dormir, e enfatizou que em seus sonhos a beleza da mulher em sua frente fez questão de aparecer. Esmeralda contou que, naquele dia, almoçava na casa de uma amiga, e pediu para usar o computador, apenas para verificar alguns e-mails. Aproveitou para usar o programa de mensagens instantâneas, e conversou com um novo usuário. Com alguma vergonha, disse que foi paixão à primeira vista.

Quem os visse conversando diria que se conheciam há tempos (o que não deixava de ser verdade). Sentiam-se à vontade naquele momento, seguros com a presença do outro. Mas a hora havia corrido, como em poucas vezes acontece.

- Venha, deixo você em casa – Romão aproveitaria a viagem para ouvir a voz de sua companheira por mais alguns minutos. Fez questão de esconder seus velhos hábitos como dirigir em alta velocidade, buzinar e cantar em voz alta. Ao chegarem à casa de Esmeralda, recusou educadamente o convite para um café, mas a acompanhou até o portão, abrindo a porta do carro para ela passar. Despediram-se com um beijo nas costas da mão, e um abraço carinhoso.

- Nos falamos pelo computador, ou no próximo encontro.

Esmeralda entrou em sua casa sorridente, feliz por aquele encontro, depois de algum tempo sem sair com alguém. Romão sabia que aquela mulher era especial, alguém para um relacionamento sério e duradouro. Pensaram, como se fossem ligados telepaticamente, nada como um encontro à moda antiga após conversas virtuais.


Conto recentemente publicado no ONE

Nenhum comentário:

Postar um comentário