segunda-feira, 17 de maio de 2010

Livro dos ditos populares


O hábito da leitura antes de dormir é restrito a poucos. Muitos preferem receber informações de uma tela colorida e falante, sem precisar realizar o esforço de se concentrar e raciocinar sobre o que está entrando no subconsciente. Mas essa é uma decisão íntima e passível de uma sazonalidade incomum: um dia se está disposto a ler, no outro apenas a dormir, e no terceiro somente uma ida ao bar acalma o cidadão.

Naquela noite em especial quis ler, e pegou um livro que estava no criado-mudo de sua mulher. o título era "O livro dos ditados populares". Abriu uma página ao acaso. Leu a seguinte frase: em briga de marido e mulher, ninguém põe a colher.

Ora, dissesse isso ao vizinho do lado, que esfaqueou a esposa e a deixou três dias no hospital. A gritaria entre os dois era audível durante toda a tarde, e já criava a expectativa de um desfecho violento. Mas ninguém falou nada, ou chamou a polícia, ou sequer tentou acalmar os ânimos do casal.



Primeira bola fora do livro esquecida, abriu outra página. Desta vez, o ditado era "quem tem boca vai a Roma". Naquele momento, lembrou de uma aula do Professor Pasquale Cipro Neto, que contou as origens deste ditado. O correto seria "vaia Roma", do verbo vaiar. Quem tem boca critica o Império, que fez escravos, matou, humilhou, estuprou e depois caiu. Ir a Roma, somente de avião ou navio.

Mas este ditado cotemporâneo é real. Na era das comunicações, quem tem o dom da fala pode obter um padrão de vida melhor, buscar bons empregos e liderar as outras pessoas (além de influenciá-las para benefício próprio). Quem fala bastante consegue namorar, obtêm fama e às vezes fortuna. O livro tinha seu valor.

Quis ler o último ditado antes de ficar deitado. Abriu na página que dizia "em boca fechada não entra mosquito". Um livro conseguiu contradizer o próprio leitor. Apagou a luz e foi dormir.

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