terça-feira, 4 de maio de 2010

Os amigos e o mar


O dia já amanhecia quando João acordou. O frio da manhã em alto-mar não era cortante, nem incômodo o suficiente para fazê-lo vestir um agasalho. O céu estava lindo: estrelado e ao mesmo tempo em tons escuros e claros do azul, dependendo de onde olhasse, e amarelo no horizonte. Resolveu ligar o motor do iate para seguir mais ao fundo: ainda era possível ver a costa, mesmo que pequena e longe, e isso o incomodava.


O barulho fez com que Carlos acordasse, com uma leve dor de cabeça pelas cervejas ingeridas na noite anterior. Não, caro leitor, não se trata de um casal homossexual, mas sim de dois amigos que saíram para pescar em alto-mar. Carlos, casado e pai de duas meninas, estranhou o colega estar vestindo apenas uma bermuda e uma camisa.

- O frio daqui é mais gostoso que o do continente. Vou parar aqui e colocar a âncora. Sabe, amigo, tem horas que invejo você. Casou com uma bela mulher, tem duas garotinhas lindas, e ainda teve permissão para vir acompanhar este boêmio numa singela pescaria.

Carlos riu com o canto da boca. Nunca imaginaria que João sentia inveja dele.

- João, você teve mais mulheres que nossa turma da faculdade inteira, nos 5 anos de curso...
- Eu sei, eu sei. Coisas que o dinheiro pode trazer. Tive várias mulheres, de todos os tipos. Com peito grande, com pequeno, loiras, ruivas, morenas. Modelos, atrizes e advogadas. Uma mais bela que a outra.

Lançaram as varas e ficaram em silêncio por alguns minutos.

- Presenciei imagens típicas de revistas: beldades acordando em lençóis de seda, como paisagem montanhas intocadas. Fiz várias delas felizes com jóias e viagens. Tinha horas que lembrava de quem já havia namorado e me senti um ginecologista.

Carlos dividia sua atenção entre os peixes e o amigo.
- Mas no fundo, cara, somente uma mulher me fez feliz, e posso dizer que amei de verdade: a Vera.
- A sua ex-empregada? Cara, você tinha 17 anos e ela, 30?
- É, mais ou menos. Ela me fez homem, sabia me deixar louco de paixão, e atiçava minha criatividade, ao bolar planos para nos encontrarmos de forma escondida.
- Parece enredo de novela. Após ficar rico, o homem procura um grande amor. E novela das ruins...

Voltaram a atenção à pesca.

- Sabe como é: as que eram boas, eram boas demais. As más, só queriam meu dinheiro. A Vera foi a única que nunca pediu dinheiro ou presentes. Bom foi você, que encontrou logo sua esposa.
- Meu caro, inveje apenas os momentos bons. Há momentos ruins e nem um pouco passíveis deste sentimento. Todas as relações são assim.

Pararam a conversa para lutar contra um peixe. Tiveram que os dois dividirem o manejo da vara, até cansar o animal marinho.

- Afinal, para que estamos falando isso?
- Não sei, vamos, me ajude com esse grandão aqui.

Riram, em alto e bom som, e continuaram a aproveitar o dia.

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